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O Banquete

A República de Platão é o livro mais conhecido do filósofo grego. Contudo, em "O Banquete", também conhecido como Simpósio, Platão vai discutir as naturezas do amor e da alma.

Boas Festas!!

24.12.24 | Servido por José Manuel Alho

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Car@s leitores e seguidores,

Com a chegada do Natal e a proximidade do novo ano, o ritmo de publicações aqui no blog irá abrandar temporariamente. Este é um período de reflexão, descanso e partilha, que aproveitarei para recarregar energias junto dos meus.

Agradeço o vosso apoio e companhia ao longo deste caminho. Desejo a tod@s um Natal cheio de paz e alegria, e um Ano Novo repleto de realizações e de (muitos) momentos felizes.

Voltaremos em breve, com a independência de sempre!

Até já!

Crónicas com tradição (XIX) - Em casa, com a família

23.12.24 | Servido por José Manuel Alho

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Imagem retirada daqui

O Natal está a chegar. A casa vai ganhando forma com uma indumentária singular. A atmosfera acumula os tons e os aromas que só este tempo traz com genuína autenticidade. Os netos chegaram. Por ora, acabaram as aulas e começou um merecido período de descanso.

Com os miúdos a correrem por toda a casa, constrangidos por uma chuva que impossibilita outras aventuras a céu aberto, tudo parece fazer sentido. Ao fundo, o zunido do mar abençoa este tão esperado quanto sentido (re)encontro familiar. Uma aguarela que se adivinha perfeita.

A sala de estar, palco privilegiado de tantas etapas que a família já enfrentou, dispõe-se a acolher a peça maior marcada para a noite de Consoada. Com as paredes revestidas a granito, a lareira, escurecida pelo rigor de outros Invernos, ameaça ser a atração em redor da qual desaguarão todas as histórias e historietas que assinalarão, qual prova de vida, o vigor daquela união familiar.

Depois de a árvore de Natal ter sido erguida e ornamentada por Fernando, o patriarca do clã Moura Bastos que nunca negligencia o presépio com o verde-musgo colhido nas fartas redondezas daquele refúgio, é tempo de Aurora entregar-se à doce tarefa de garantir que nenhum objeto decorativo falhará o momento. Tudo é religiosamente colocado no sítio de sempre porque através cada uma das peças se conta a história da família em suaves legendas, celebrizadas pela memória coletiva de consecutivas gerações. As mantas são dobradas com inigualável saber e o castanho velho da mobília aperalta-se para receber os gloriosos convivas para ali desde sempre convocados.

Abrem-se as portadas e correm-se as cortinas. Apesar da chuva que persiste em encharcar a vidraça, entra uma luz que inunda de vida um espaço nem sempre pejado de brilho.

Contando já com o apoio das três noras, que se acotovelam na conferência das mais recentes novidades e demais cusquices atreladas, Aurora aventura-se na difícil arte de as aliciar para os encantos da doçaria natalícia. Entre palpites e outras considerações a respeito das rabanadas, dos sonhos de cenoura, das broinhas e dos coscorões, nada parece afinal arrebanhar aquelas almas da grande urbe para a nobre arte açucarar este final de ano tão penosamente azedado por uma crise que a todos vai esganando.

Mas é o bacalhau que vai merecendo o consenso geral. O ruído quase histérico das mães não logra abafar a curiosidade de Dinis, o rapaz que em setembro passado ingressou no 4.º ano e já anda inquieto com o exame de abril próximo. Responsável e invulgarmente metódico, tenta sacar da avó informação que lhe permita enriquecer o texto que terá de redigir sobre a sua Consoada. Há muito que está curioso por saber “os porquês” de ser tradição comer bacalhau na Ceia de Natal. Aurora não descura o apetite do neto e revela o que sabe:

- Sim. Na ceia de Natal, manda a tradição portuguesa que se coma o bacalhau. Olha, a origem do consumo deste peixe já vem do tempo dos vikings. Há quem diga que foram eles que descobriram o bacalhau. Mas foi nas costas de Espanha que os bascos começaram a salgar o bacalhau e depois a secá-lo para uma melhor conservação. Este método garantia que se aguentasse por muito tempo assim como mantinha os seus nutrientes e apurava o paladar. Mil anos depois, o bacalhau passou a ser comercializado pelos bascos. E foi aí que se revolucionou a alimentação.
Na Idade Média, os cristãos começaram a consumir bacalhau. Sabes, os cristãos deviam obedecer a dias de jejum, o que levava as pessoas a porem de parte a carne da sua alimentação. O bacalhau, como era mais barato, tornou-se no alimento escolhido pelo povo durante as festas religiosas como o Natal e a Páscoa.
Com o passar dos séculos, o jejum foi desaparecendo, mas a tradição do bacalhau, sobretudo na ceia de Natal, manteve-se até aos nossos dias.
De início, era alimento barato e presente na mesa da população mais pobre. Depois da Segunda Guerra Mundial, o bacalhau tornou-se num peixe só consumido pelos mais ricos. A falta de alimentos em toda a Europa levou à subida de preço do bacalhau e o seu consumo limitou-se aos mais poderosos. Os mais pobres apenas se davam ao luxo de o consumir nas principais festas cristãs, o que também contribuiu para a tradição do seu consumo na Ceia de Natal. Percebes agora?! – concluiu com pachorrenta disponibilidade.

Dinis, receoso de esbanjar tão preciosa informação, esgueirou-se para o seu novo quarto onde se apressou a registar o essencial da explicação veiculada pela avó Aurora.

Entretanto, a matriarca decide-se a pôr termo à indefinição até então reinante entre as noras e larga com cirúrgico pragmatismo:

- Meninas, quem vai afinal fazer o quê?...

ADSE: entre o subsídio obrigatório e um seguro privado de segunda

22.12.24 | Servido por José Manuel Alho

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Imagem retirada daqui

Na sequência desta notícia, reforço o meu entendimento de que a ADSE, esse "pilar" da saúde pública dos funcionários públicos, continua a demonstrar a sua capacidade de transformar um subsistema contributivo em algo que oscila entre uma benesse pública e um seguro privado mal disfarçado. Vejamos os "avanços":

  1. Contribuição de 3,5% sobre o vencimento: É quase um luxo de seguro privado — com uma diferença crucial: os privados oferecem, muitas vezes, mais coberturas e menos dores de cabeça. Aqui, paga-se um prémio obrigatório para se ter o privilégio de se ser tratado como cliente de segunda.
  2. 14 mensalidades por ano: Ao que parece, na lógica da ADSE, o tempo será elástico. Um ano tem 12 meses, mas o desconto não conhece fronteiras. Aparentemente, a matemática de quem gere o subsistema é outra: multiplicar a arrecadação enquanto corta custos e empurra mais encargos para os beneficiários. Tudo com ares de "reformas estruturais" e "benefícios futuros".
  3. Médicos e operadores privados a recusar convenções: Quem aceitaria trabalhar por valores desatualizados, quando o mercado paga melhor? E que solução propõe a ADSE? Aumentar alguns pagamentos aos prestadores (com pompa e circunstância), aumentando igualmente os custos para os beneficiários. O famoso ganha-ganha... mas só para os outros.
  4. Aumento das consultas para 25 euros no regime livre: Um "avanço", garante-se. Mas vejamos: os beneficiários pagam mais nas consultas convencionadas (1 euro extra aqui, 2 euros ali) e, no final, contribuem mais uma vez para o equilíbrio financeiro de um sistema que deveria, acima de tudo, servi-los convenientemente.
  5. Teto máximo de 500 euros para cirurgias: Uma medida que parece benéfica — à primeira vista. Mas não seria mais justo usar o montante da contribuição anual para reduzir encargos reais dos beneficiários, ao invés de perpetuar esse ciclo de aumentos progressivos e "compensações calculadas"?

A verdade é que o subsistema ADSE parece preso entre a lógica de um serviço público e as exigências de um mercado privado, mas com o pior dos dois mundos: contribuições altas, limitações crescentes e uma dependência absurda de convenções instáveis. No final, a quem serve a ADSE? Ao beneficiário que paga 14 mensalidades e ainda se vê com crescentes custos diretos, ou a um sistema que equilibra contas às custas da paciência de quem contribui?

Orçamento para as pessoas ou desculpa para os buracos?

21.12.24 | Servido por José Manuel Alho

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A velha retórica do “orçamento para as pessoas” continua a ser um refúgio confortável para quem tenta justificar escolhas políticas discutíveis ou, assustadoramente, invertidas. É claro que cuidar de quem mais precisa é essencial – ninguém discordará. Mas usar este argumento como escapatória para negligenciar infraestruturas básicas, como estradas em condições, passeios transitáveis ou árvores podadas, é simplista e redutor. Afinal, as "pessoas" também precisam de segurança e qualidade de vida. E isso inclui vias transitáveis.

Compromissos com as pessoas não são incompatíveis com uma gestão equilibrada: é possível (e necessário) investir em apoios sociais sem abandonar o desenvolvimento estrutural. Reduzir o debate a uma falsa dicotomia entre cuidar das pessoas e tapar buracos é, no mínimo, um sinal de miopia estratégica – e, no máximo, uma desculpa conveniente para desviar atenções de prioridades mal geridas ou até mesmo mascarar obra que, afinal, não foi feita.

Lideranças à portuguesa ou a arte de abrir caminhos sentado

20.12.24 | Servido por José Manuel Alho

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...for something outside the Christmas context

Tradução de tipos de lideranças nos casos concreto de:

CEO de uma grande empresa, um político ou até um gestor público: Ao invés de abrir caminho, estaria provavelmente sentado numa cabana aquecida, a olhar pela janela enquanto os "seguidores" escavam o caminho por ele. E é claro, no fim da empreitada, haveria uma entrevista para a televisão onde explicaria como foi ele, sozinho, o responsável por levar a matilha ao destino (nunca mencionaria os subsídios ou os cortes nos recursos dos outros lobos).

No setor público: O lobo líder seria aquele que prometeria reformas milagrosas, mas quando vamos ver, estaria só a marcar a sua pegada com os pés dos que realmente trabalharam. Afinal, há que manter o currículo intacto para o próximo cargo (ou quem sabe, um lugar na administração de uma "empresa de neve").

Conclusão: Quando tudo corre mal, estes "líderes" serão os primeiros a dizer que a culpa é da tempestade, do terreno ou até dos próprios lobos que não souberam seguir as suas ordens sempre doutas. Não sei se em Portugal abundarão os líderes que abrem caminhos, mas conheço uma maioria deles que adora pavimentar desculpas…

De um dos principais representantes do surrealismo em Portugal

20.12.24 | Servido por José Manuel Alho

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Você quer ver?

 

"Você quer ver o mundo mudar?
Comece por não lavar a louça.
Deixe-a empilhar até ao altar,
Onde o vizinho chama a polícia!

Você quer ver a moral ruir?
Vá ao trabalho de pijama!
Mas sorria — só para fingir
Que a gravata agora é uma cama.

Você quer ver o chefe pasmar?
Responda-lhe: “Hoje, não quero.”
E quando ele gritar, a esbravejar,
Ofereça-lhe um poema sincero.

Você quer ver o caos triunfar?
Dance no meio do supermercado!
E quando alguém lhe for censurar,
Convide-o para um fado animado.

A provocação, meu caro leitor,
É uma arte de pura invenção.
Não é revolta, nem só clamor,
É rir-se do mundo com paixão."

Mário Cesariny

"Ninguém é bom nem mau. Somos todos, principalmente, conforme"

18.12.24 | Servido por José Manuel Alho

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"Ninguém é bom nem mau. Somos todos, principalmente, conforme" (Machado de Assis)

Ensinar além do conformismo

Esta é uma das mais famosas e inspiradoras frases da literatura brasileira, atribuída ao escritor Machado de Assis, no seu livro "Memórias Póstumas de Brás Cubas" que, desde o meu primeiro ano de estudante na Universidade de Aveiro, me inspirou e até hoje se mantém como uma interpelação diária à minha condição de Professor. Aliás, até consta do meu Perfil neste blog.

A frase de Machado de Assis, “Ninguém é bom nem mau. Somos todos, principalmente, conforme”, soa de maneira inquietante quando transposta para o universo da Educação. No ensino, os alunos não serão apenas "bons" ou "maus" estudantes, mas sim reflexos do contexto que os moldam desde tenra idade: a sala de aula, o professor, a escola, a família, a sociedade, entre outros. O seu desempenho e o seu comportamento são, em grande medida, "conformes" às condições que lhes são oferecidas ou impostas.

Enquanto professores, cabe-nos perceber que ensinar não é um ato que se confine à mera transmissão de conteúdos e de conhecimentos, mas um processo iminentemente relacional e contextual. A Psicologia da Aprendizagem explica esta verdade de forma particularmente sustentada. De facto, é (muito) fácil rotular um aluno como “difícil” ou “excelente”, mas essas classificações, habitualmente simplistas e redutoras, ignoram a complexidade de cada indivíduo. Um estudante, seja ele criança ou jovem, que aparente desinteresse ou alheamento, pode estar a enfrentar desafios invisíveis, enquanto outro, aparentemente aplicado e comprometido, pode esconder fragilidades profundas e absolutamente inimagináveis.

É aqui que os professores são convocados para se assumirem como agentes de mudança num contexto iniludivelmente singular e desafiante. Deveremos, por isso, indagarmo-nos: como é que a sala de aula se poderá conformar às necessidades dos meus alunos? Estarei a proporcionar oportunidades equitativas para que todos possam progredir? Em boa verdade, reconhecer que a aprendizagem é também um espelho de circunstâncias diversas e complexas implica a assunção de um compromisso ético com a transformação do meio educativo.

Por isso, a máxima de Machado de Assis, confesso, lembra-me todos os dias que ensinar é, antes de tudo, um esforço de compreensão e de adaptação, para que os alunos possam rebelar-se contra fatalidades mal explicadas, dotando-os das ferramentas e da motivação necessárias para transcenderem as limitações que os envolvem.

Desagregações de freguesias: proximidade ou jogo político?

17.12.24 | Servido por José Manuel Alho

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A novela das freguesias parece não ter fim – nem eficácia. A prometida “reversão” das uniões de freguesias imposta pela famigerada “lei Relvas” revelou-se um processo moroso, burocrático e incapaz de atender à verdadeira essência do poder local: a proximidade com os cidadãos. Após anos de inércia, de debates estéreis e do rodovalho politiqueiro, eis que a comissão parlamentar retoma o tema, com prazos apertados e decisões adiadas para não atrapalhar congressos partidários.

O relatório do GTF (Grupo de Trabalho das Freguesias) expõe uma realidade incontornável: a evidente falta de preparação técnica e de consenso político. Dos 182 pedidos iniciais, quase 80 falharam no “crivo”, não por ausência de mérito, mas por questões formais e interpretações de prazos. O impacto da queda do governo Costa também mostra como as freguesias continuam reféns da instabilidade política nacional. É será isso o que queremos para o poder local? Um modelo onde as populações são o último fator de consideração?

Resta saber se esta desagregação será um verdadeiro regresso à proximidade ou apenas mais um ajuste de peças no tabuleiro eleitoral onde se digladiam obnóxios caciques e demais clientelas localizadas.

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