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O Banquete

A República de Platão é o livro mais conhecido do filósofo grego. Contudo, em "O Banquete", também conhecido como Simpósio, Platão vai discutir as naturezas do amor e da alma.

Portagens na A25: a vergonha que todos fingem ignorar

29.06.25 | Servido por José Manuel Alho

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Imagem retirada daqui

Lei no papel, portagens na prática

A Lei n.º 37/2024, de 7 de agosto, eliminou expressamente as portagens em toda a extensão da A25, mas três pórticos (Esgueira-Aveiro, Estádio-Angeja e Angeja-Albergaria) continuam a cobrar €0,90 por viagem. Esta contradição foi até apontada como “ilegal” pela Plataforma “P’la Reposição das SCUT”, que lembra que “a Lei n.º 37/2024… estabelece a eliminação de todas as portagens na A25”. Em vez de assumir esta interpretação da lei, a concessionária Ascendi parece ter estacionado as cancelas no meio do caminho. Os utentes ouvem as desculpas de quem gizou a já famosa Lei: “foi um caminho, não um fim”. O resultado? Numa autoestrada de quase 200 km, apenas 13 km ainda têm portagem – uma aberração que o (ainda) presidente da Câmara de Aveiro in illo tempore qualificou de “injusta, absurda e até ridícula”.

Sobre este assunto, lembro ainda as minhas publicações AQUI e AQUI.

O custo social e económico da discriminação

Para além da imputada ilegalidade, há um pesado custo social. Um estudo do ISEG confirma que a introdução de portagens nas antigas SCUT provocou quedas substanciais nas vendas e lucros das empresas locais, repercutindo-se no emprego. Em contrapartida, eliminar as portagens aceleraria o turismo, o comércio e a coesão territorial. As populações do interior teriam mobilidade mais barata e mais oportunidades de trabalho e lazer, invertendo a tendência de desertificação. A Câmara de Albergaria-a-Velha até chegou a lembrar que a cobrança naquele troço “discrimina” moradores e empresas locais, penalizando quem ali vive ou trabalha.

Portagens de ouro: o silêncio que alimenta o lucro

De quem é, afinal, o negócio? Certamente, não dos cidadãos. As SCUT sem custos foram transformadas em concessões obscuras, onde “as populações serão reféns do lucro desmedido das concessionárias”. A Ascendi lucra (ilegalmente?) às custas do bolso do já sobrecarregado contribuinte, mantendo portagens que, não duvido, engordarão as contas da empresa. Na minha opinião, este negócio precisa de fiscalização: que interesses estão por trás desta vergonha, e quando vão repor o que é nosso por direito?

Partidos em campanha, compromissos em dívida

No entretanto, a classe política aparenta ter optado por, somente, assistir à contenda. Depois do novo governo tomar posse, esperava-se ação imediata, mas nada mudou. O PS, que propôs eliminar só parte dos pórticos, diz agora que isso é apenas “o princípio”. PSD, CDS, IL, BE e outros calam-se, adotando estratégias eleitorais em vez de resolver o problema. Até o PCP ironiza a trapalhada, lembrando que há políticos que “criaram as portagens sem qualquer justificação” e agora gabam-se de as ter acabado.

E em Albergaria, onde o impacto da injustiça é diário, o silêncio dos partidos com representação local é ensurdecedor. No meio de tanta azáfama pré-autárquica, com listas a serem anunciadas, rostos sorridentes a emergirem e promessas a serem ensaiadas, ninguém se digna a falar no assunto. Terá o tema morrido para os partidos ou morreu apenas a coragem de o enfrentar? Com eleições autárquicas à vista, os utentes não vão perdoar mais esta indiferença. Exigem-se agora compromissos públicos claros e vinculativos – não mais desculpas nem encenações pré-eleitorais.

Sobre a eternidade à nossa porta

29.06.25 | Servido por José Manuel Alho

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QUANDO
 
Quando o meu corpo apodrecer
e eu for morta,
Continuará o jardim, o céu e o mar,
E como hoje, igualmente hão-de bailar
As quatro estações à minha porta.
Outros em Abril passarão no pomar
Em que eu tantas vezes passei,
Haverá longos poentes sobre o mar,
Outros amarão as coisas que eu amei.
Será o mesmo brilho a mesma festa,
Será o mesmo jardim à minha porta.
E os cabelos doirados da floresta,
Como se eu não estivesse morta.
 

O mistério das coisas nomeadas

28.06.25 | Servido por José Manuel Alho

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A PALAVRA
 
Falo da natureza.
E nas minhas palavras vou sentindo
A dureza das pedras,
A frescura das fontes,
O perfume das flores.
Digo, e tenho na voz
O mistério das coisas nomeadas.
Nem preciso de as ver.
Tanto as olhei,
Interroguei,
Analisei
E referi, outrora,
Que nos próprios sinais com que as marquei
As reconheço, agora.
 
S. Martinho da Anta, 13 de Abril de 1965.
In Diário X

Mesmo sendo uma figura de cortar a respiração, ninguém quer saber de mim…

27.06.25 | Servido por José Manuel Alho

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Acho que preciso de um hobby... toda a gente foge de mim como da Morte!

 

Mesmo a Morte, essa figura universal e implacável, tem os seus dias de solidão e de crise de identidade. No fundo, talvez só queira ser compreendida, ou — ironia das ironias! — sentir-se viva.

Afinal, quem nunca se sentiu um pouco evitad@, mesmo fazendo apenas o seu trabalho? Talvez a empatia de uma boa escuta seja o único remédio, até para quem nos leva no fim da consulta.

Os bons sofrem, os maus nadam

24.06.25 | Servido por José Manuel Alho

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Luís de Camões, com a sublime precisão de quem viu o mundo pelo avesso, resume em meia dúzia de versos o que muitos se recusam a admitir: a injustiça social, por não ser um fenómeno moderno, é – há muito – património da humanidade.

Vemos os bons a lutarem, a resistirem, mas a serem esmagados pela máquina trituradora do poder e da corrupção. No entretanto, os maus — esses artistas da manha e do compadrio — deslizam, impunes, num mar de contentamentos. A mediocridade, em traje(s) de gala, desfila triunfante e com indisfarçável soberba.

Camões espantava-se. Nós, já nem isso. A anestesia moral parece ter tomado conta do nosso tempo. Habituámo-nos à inversão de valores como quem se habitua a um imposto novo — resmunga-se, mas paga-se. Estranha-se, mas depois entranha-se.

Se calhar, o verdadeiro espanto seria vermos, um dia, os bons a nadar e os maus a afundarem-se no seu próprio lodo. Mas enfim... a esperança, como sempre, é o último fôlego antes do naufrágio.

Do ensino à distância à lógica ausente: e se os computadores tivessem ficado nas escolas?

22.06.25 | Servido por José Manuel Alho

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Imagem retirada daqui

Escola Digital: promessa virtual, problemas reais

Em Portugal, a atribuição de computadores aos alunos durante a pandemia foi uma medida inserida num programa mais amplo de transformação digital da educação, visando assegurar a continuidade do ensino à distância.

Programa que enquadrou o apetrechamento tecnológico

O apetrechamento tecnológico foi enquadrado principalmente pelo Programa Escola Digital, que por sua vez se insere em planos mais vastos como o Plano de Ação para a Transição Digital (Resolução do Conselho de Ministros n.º 30/2020, de 21 de abril) e o Programa de Estabilização Económica e Social (PEES) (Resolução do Conselho de Ministros n.º 41/2020, de 6 de junho).

No âmbito legal, o Decreto-Lei n.º 10-A/2020 e o Decreto-Lei n.º 14-G/2020 (e suas alterações subsequentes, como o Decreto-Lei n.º 20-H/2020, Lei n.º 20/2020 e Decreto-Lei n.º 68/2020) foram fundamentais para a execução das medidas de ensino a distância, incluindo a dotação de equipamentos.

Resumo da sua execução/implementação

A execução do programa de atribuição de computadores foi pautada por: 

  • Fases de atribuição: A distribuição de equipamentos foi faseada, com prioridade inicial para alunos beneficiários da Ação Social Escolar (ASE) dos escalões A e B. O objetivo final era a universalização da Escola Digital, ou seja, a disponibilização de um computador e conetividade para todos os alunos e docentes.
  • Empréstimo dos equipamentos: Os computadores foram cedidos a título de empréstimo gratuito aos alunos, com a obrigação de os restituir no final do ciclo de estudos correspondente à tipologia do equipamento. Não se tornaram propriedade dos alunos ou das escolas.
  • Plataforma de registo: A identificação dos equipamentos entregues foi centralizada numa plataforma gerida pelo Ministério da Educação.
  • Conetividade: Para além dos computadores, foi prevista a atribuição de conetividade à internet, muitas vezes através de cartões SIM, para garantir o acesso ao ensino online.
  • Restrições de uso: Foram estabelecidas proibições de instalação/cópia não autorizada de software e de alteração de hardware nos equipamentos. Os encarregados de educação/alunos ficaram responsáveis pela sua conservação e pela comunicação de perda ou roubo.

 

Custo para o Orçamento do Estado

O investimento previsto para o programa "Universalização da Escola Digital" foi de cerca de 400 milhões de euros, sendo maioritariamente financiado por fundos comunitários, como os do Programa de Recuperação e Resiliência (PRR). O PRR direcionou 500 milhões de euros para o programa Escola Digital até 2025, prevendo a aquisição de 600.000 computadores (com um custo estimado entre 180 e 240 milhões de euros para estes).

Faço notar que, embora o investimento global fosse significativo, houve numerosos relatos de atrasos na compra e entrega dos equipamentos, e críticas relativas à sua qualidade e à gestão do processo.

Previsão de prazo de execução e programa de manutenção/reparação

  • Prazo de execução: A implementação do programa ocorreu por fases ao longo do período da pandemia e nos anos seguintes, com o objetivo de universalizar o acesso até ao corrente ano de 2025 (no âmbito do PRR).
  • Manutenção e reparação: A questão da manutenção e reparação dos equipamentos foi assim considerada:
  1. Durante o período de garantia, a reparação é da responsabilidade dos fornecedores.
  2. Face à preocupação com a expiração da garantia dos equipamentos, o Orçamento do Estado para 2023 reservou verbas para a criação de um sistema de reparação, recondicionamento de equipamento, atualizações de software e antivírus.
  3. Mais recentemente, em março de 2025, o Ministério da Educação, Ciência e Inovação (MECI) anunciou a disponibilização de 4 milhões de euros às escolas para reparar computadores avariados, em preparação para as provas digitais. No final de 2024, já tinham sido disponibilizados 10,6 milhões de euros para o mesmo fim, embora apenas 6,4 milhões tivessem sido executados.

Em abstrato, o programa de apetrechamento tecnológico foi uma esforçada tentativa de resposta à necessidade de garantir o ensino à distância durante a pandemia, enquadrado em políticas de digitalização mais abrangentes e com mecanismos previstos (no papel) para a manutenção dos equipamentos, ainda que a sua implementação tenha enfrentado alguns desafios.

Cartões SIM devolvidos, problemas SEM solução

Entretanto, houve uma diretriz para a devolução dos hotspots (e cartões SIM) pelos professores e pela maioria dos alunos para, supostamente, redefinir e racionalizar a atribuição de conectividade gratuita. Esta medida gerou forte contestação por parte dos sindicatos de professores, que consideraram a decisão um recuo na digitalização e uma imposição de mais encargos financeiros para os docentes, uma vez que grande parte do seu trabalho ocorre fora da escola. Os sindicatos argumentaram que retirar o acesso gratuito à internet sem uma alternativa adequada compromete as condições de trabalho dos professores.

Embora a devolução não fosse para aumentar a “força de sinal", a verdade é que as redes de internet nas escolas continuam a ser um desafio, com muitas unidades escolares a reportar falhas e avarias nos equipamentos, e falta de técnicos e verbas para reparação. Ou seja, o problema da qualidade da internet nas escolas subsiste independentemente da devolução dos hotspots.

Desafios na implementação

Apesar do investimento elevado, cumpre lembrar que a execução do programa registou problemas. A entrega dos equipamentos não respeitou os prazos contratuais: computadores destinados a setembro-outubro de 2020 só chegaram às escolas no fim de 2020 e foram entregues aos alunos apenas em início de 2021, forçando cortes nos valores pagos. Também o contrato de conetividade ficou aquém do previsto: dos 9,0 M€ contratados foram pagos apenas 6,6 M€ (com IVA), pois muitos hotspots nunca foram ativados. O Tribunal de Contas (TdC) destacou ainda outras deficiências operacionais: sistema deficiente de registo, equipamentos de qualidade frágil ou mal-acondicionados e falta de seguro ou assistência técnica adequada.

O Tribunal de Contas sublinhou também a falta de planeamento no acompanhamento do programa: não existiu um sistema integrado para identificar alunos sem recursos digitais nem para registar a distribuição e devolução dos kits. As escolas tiveram de improvisar métodos próprios de gestão dos equipamentos. Ademais, o modelo impôs aos encarregados de educação encargos adicionais: estes assinavam termos de responsabilidade pelo uso do kit, pagando seguros e eventuais recargas de dados que ultrapassassem os cerca de 12 GB básicos. Não surpreende, portanto, que a adesão não tenha sido universal – cerca de 20% dos alunos elegíveis recusaram o kit. Em resumo, a execução ficou longe de corresponder aos objetivos iniciais.

O próprio Tribunal de Contas concluiu que, embora o ensino à distância estivesse implementado, continuavam a existir muitos alunos e professores sem os meios digitais necessários. Os auditores sublinharam ainda a ausência de um plano estratégico para substituir os equipamentos no fim do seu ciclo de vida e a falta de mecanismos centralizados para evitar duplicar apoios em meios digitais. Adicionalmente, observou-se que a autorização de 386 M€ para este programa só ocorreu no fim do ano letivo de 2019/20, motivo pelo qual a maior parte do material só começou a chegar em 2021. O Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) prevê agora 559 milhões de euros para a Escola Digital, mas o TdC recomenda antes o aperfeiçoamento dos sistemas de gestão – planos de substituição, controlo de duplicações e indicadores claros – para garantir que esse investimento se traduza em resultados efetivos.

O computador é da Escola ou da Família? A pergunta que pode ter custado milhões.

Volvido este tempo, constata-se que muitas escolas afiançam não ter como assegurar, com regularidade e eficácia, a manutenção e a reparação dos equipamentos disponibilizados no âmbito do Programa Escola Digital. Pior: desconhece-se se as novas gerações de alunos que ingressam no 1.º Ciclo terão, efetivamente, acesso a um computador portátil — isto num contexto em que se exigem provas de avaliação digitais, como as Provas ModA. Muitos profissionais da educação relatam que várias famílias se apoderaram dos equipamentos, fazendo uso indevido dos mesmos: computadores transformados em consolas de jogos, em plataformas de streaming ou em “brinquedos tecnológicos” para uso pessoal. Resultado? Custos de reparação a disparar e um modelo de gestão insustentável.
Em face do exposto, mantenho o que sempre defendi: os computadores deveriam ter sido entregues às escolas, devidamente acondicionados, geridos e usados em contexto educativo. Essa opção — simples, lógica e fiscalmente responsável — teria reduzido substancialmente os encargos com manutenção, assegurando/incrementando o seu uso pedagógico e evitado que muitos portáteis acabassem esquecidos num qualquer canto da casa… ou, quem sabe, à venda no OLX.

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