A moralidade dos impostos: uma ameaça à riqueza?
Sobre os pobres ricos de Portugal, essa espécie rara que merece todo o amparo.
Filipe Charters de Azevedo, na sua cruzada pela liberdade, alertou-nos, em notícia publicada na passada segunda-feira, para um perigo iminente: taxar fortunas acima de três milhões de euros. Afinal, segundo ele, os impostos existem para financiar bens públicos, mas sem moralismos, porque não vá alguém confundir justiça social com ética.
A lógica afigura-se cristalina: o problema não será a desigualdade galopante, nem a fuga ao fisco disfarçada de "planeamento fiscal". Não, o drama residirá em quem ousa questionar se é aceitável que o dono de um iate pague menos imposto, em proporção, que o trabalhador precário. Segundo o presidente da APC, devemos acarinhar os ricos, que, desafortunadamente, mal resistem à tentação de fugir para outros paraísos fiscais (digo, países).
Filipe Charters de Azevedo, com a sua visão aguçada, alerta-nos para o risco imediato de afastar os poucos ricos que ainda restarão em Portugal. Porventura, será preferível manter um sistema fiscal que favoreça a concentração de riqueza nas mãos de poucos, em vez de promover uma distribuição mais equitativa.
É também curioso pensar que a criação de negócios valiosos pareça depender exclusivamente da ausência de impostos sobre grandes fortunas. Se calhar, os empreendedores estarão apenas à espera de um sinal verde para investir milhões, desde que não tenham de pagar um cêntimo a mais em impostos.
Em abstrato, e mesmo não sendo particular seguidor das ideias do BE, propostas que visem taxar fortunas estratosféricas, poderão ser, se bem calibradas, um convite à equidade. Uma tentativa de relembrar que os impostos não são apenas um meio de financiar o Estado, mas também uma ferramenta de redistribuição da riqueza num país onde o fosso social (só) se alastra e aprofunda.
Se a moralidade incomoda, talvez o problema não esteja nesta ou noutras propostas conexas, mas em quem delas foge.