Autonomia Docente: o pilar esquecido da exigência no ensino?
Ensino ou Estatísticas?
A urgência de (re)valorizar os Professores
A verdadeira exigência no ensino, em Portugal, continuará (sempre) refém de uma política que privilegie números sobre realidades. As estatísticas do sucesso escolar, frequentemente exibidas como troféus em relatórios nacionais e internacionais, poderão estar a mascarar um problema estrutural: a qualidade do ensino não se mede apenas por taxas de aprovação, mas pela formação sólida de cidadãos autónomos, críticos e competentes. Como advertiu Paulo Freire, “não há educação neutra”. Por isso, submeter o ensino ao crivo das estatísticas transforma a aprendizagem numa mera formalidade, um processo sem substância.
Para mim, o cerne da questão está na Autonomia Docente. Devolver aos Professores a capacidade de reter alunos — quando necessário e pedagogicamente justificado — é essencial para a integridade do sistema educativo. A legislação atual, nomeadamente o Decreto-Lei n.º 54/2018, valoriza a inclusão e combate a exclusão escolar, mas frequentemente coloca os Professores entre o martelo da pedagogia e a bigorna da burocracia. Se calhar, o que se tem feito aos Professores portugueses equivalerá à desfaçatez de, um dia destes, retirar aos médicos a capacidade de, por si, prescrever medicamentos e respetiva posologia. A Autonomia Docente, ainda que legalmente consagrada, parece ter encolhido por conveniência e pressão de muitos. Essa autonomia não é apenas a liberdade para decidir, mas a responsabilidade compartilhada na construção de um processo educativo credível e eficaz. Como sublinhou António Nóvoa, “os professores precisam de ser autores, não executores de normas”. Quando os docentes dispõem da liberdade para avaliar sem receio de represálias, garantem um ensino ajustado às necessidades reais dos alunos, em vez de serem cúmplices da perpetuação de falhas, muitas delas, impostas superiormente.
A este propósito, não é despiciendo lembrar Hannah Arendt quando dizia que “a educação é o ponto em que decidimos se amamos o mundo o bastante para assumirmos a responsabilidade por ele”. Privar os Professores dessa responsabilidade, seja por imposições legais ou pela pressão por resultados estatísticos brilhantes, que afaguem o ego ao poder político, é esvaziar a Escola de sentido, descaracterizando-a. A Educação de qualidade exige coragem para enfrentar os números e priorizar os alunos — não como estatísticas, mas como futuros cidadãos de um pais (que também se quer) com futuro.