Escolhas contemporâneas: entre o companheirismo e as pressões modernas
Nos dias de hoje, tenho vindo a constatar que será cada vez mais comum encontrar casais que optam por ter animais de estimação em vez de filhos. Presumo que esta escolha pode ser atribuída a várias razões. Primeiramente, a estabilidade financeira é uma preocupação crescente. Criar um filho envolve custos significativos com educação, saúde e bem-estar, enquanto os animais de estimação, embora também exijam cuidados, representam um investimento financeiro menor.
Além disso, pressinto que a busca por uma carreira profissional sólida e a realização pessoal são prioridades para muitos adultos contemporâneos. A flexibilidade e a liberdade que acompanham a opção de “vida sem filhos” permitem que os casais se dediquem mais intensamente às suas ambições e interesses pessoais. Os animais de estimação, por outro lado, oferecem companhia e afeto sem as mesmas exigências de tempo e recursos que uma criança, muito atreita a birras e outras chantagens.
Outro fator que importa ter em conta é a mudança nas dinâmicas sociais e familiares. A sociedade moderna, para o bem e para o mal, valoriza cada vez mais a individualidade e a autonomia, e os animais de estimação encaixam-se bem neste estilo de vida. Estes fiéis companheiros proporcionam uma sensação de família e de responsabilidade, mas sem as mesmas pressões e expectativas associadas à parentalidade.
Sou de opinião que esta tendência refletirá também uma transformação nos valores e nas prioridades das sociedades contemporâneas. A escolha de ter animais em vez de filhos pode ser vista, a julgar pelo que me é dado a observar, como uma resposta às exigências e pressões do mundo moderno, onde o equilíbrio entre vida pessoal e profissional é, muitas vezes, difícil de alcançar. Em última análise, esta decisão revelará muito sobre os adultos de hoje: indivíduos que procuram formas de viver de maneira plena e satisfatória, adaptando-se às realidades e desafios dos tempos atuais.
Contudo, a transformação a que aludi anteriormente ajudará a suavizar uma realidade social contundente com floreios simpáticos, mas falha ao tocar na raiz do assunto. Essa "transformação nos valores e prioridades" é menos uma escolha e mais um reflexo de um mundo onde criar filhos se tornou um luxo inacessível para muitos. O discurso do “viver de maneira plena” soa a vago, quase como um eufemismo para a busca por um alívio num sistema que (nos) sufoca. Em vez de celebrar uma suposta "adaptação", talvez fosse mais honesto questionar as razões pelas quais essa adaptação é necessária e quem realmente beneficia dela.
Em conclusão, talvez a verdadeira adaptação seja aceitar que viver plenamente hoje significa reescrever o conceito de família, enquanto navegamos – ou sobrevivemos? - num mundo que desafia, redefine e, por vezes, afunila as nossas escolhas mais íntimas.