Num mundo onde partilhar o essencial é visto como fraqueza ou ingenuidade, a compaixão de Martinho pareceria um ato de loucura ou uma imprudência financeira.
Imagem retirada daqui
Em tempos idos, São Martinho partilhou a sua capa com um pobre, revelando que, com um gesto, o calor humano supera qualquer inverno. Hoje, porém, parece que a lenda já não cabe na malha apertada do nosso "modernismo".
Num mundo onde partilhar o essencial é visto como fraqueza ou ingenuidade, a compaixão de Martinho pareceria um ato de loucura ou, no mínimo, uma imprudência financeira. Quem se atreveria a cortar a própria capa (ou o próprio salário, benefícios ou segurança) para dar a quem precisa? As capas de hoje são bens acumulados, “intransferíveis” para uma sociedade que romantiza a caridade, desde que não mexa nos alicerces da sua confortável indiferença.
O “verão” de São Martinho, o calor simbólico da solidariedade, tornou-se uma lembrança amarga num mundo que faz gala da meritocracia, mas, salvo honrosas exceções, vira a cara ao próximo. Ironia dos tempos modernos: as necessidades são evidentes, mas a capa partilhada… fica só para a lenda.