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O Banquete

A República de Platão é o livro mais conhecido do filósofo grego. Contudo, em "O Banquete", também conhecido como Simpósio, Platão vai discutir as naturezas do amor e da alma.

Portugal: um país demasiado rico para pagar a quem o ensina

12.02.25 | Servido por José Manuel Alho

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Ensinar a elite, viver na pobreza

 

Esta imagem bem poderia ilustrar um professor português contemporâneo, com boné académico, a lembrar os mais incautos que, pelas suas mãos, passaram médicos, engenheiros e cientistas, mas que o dinheiro, afinal, nunca passa. É uma sátira mordaz, que também poderia fazer ironia à custa da precarização da carreira docente em Portugal. Atentemos, pois, nas possíveis camadas desta metáfora visual:

A Desvalorização Salarial: o Professor como o novo pobre do sistema

Desde o início do século XXI, os professores portugueses têm visto os seus salários serem corroídos pela inflação, cortes e congelamentos. Foram-lhes retirados anos de serviço – uma injustiça a ser reparada em prolongadas prestações – suprimidas progressões e aplicadas medidas de austeridade que nunca mais foram revertidas. Enquanto os alunos avançam, tornando-se profissionais bem remunerados, o Professor continua a contar os trocos. A ironia aqui acaba por ser cruel: apesar de construir carreiras de prestígio, a sua remuneração não é proporcionalmente digna à sua importância. O "dinheiro que não passa" não é só um lamento; é a constatação de uma infâmia.

A insensibilidade política: governos surdos, Professor mudo (ou a indignar-se para o vazio)

O Estado português mantém uma tradição sólida de ignorar as reivindicações dos professores. Há sempre "falta de cabimentação" para corrigir injustiças salariais, mas nunca falta para consultorias obscuras, swaps ruinosos ou ajustes diretos suspeitos. A classe docente luta, faz greves, marcha pelas ruas aos sábados, e o Poder responde com reuniões inconclusivas e promessas vazias. O Professor da imagem parece atordoado, como quem, finalmente, percebeu que falar de Educação a uma certa casta de políticos é como ensinar gramática a uma pedra.

A degradação do estatuto socioprofissional: do respeito à irrelevância

O Professor já foi um intelectual respeitado, um agente propulsor de mudanças transformadoras. Hoje, é tratado como um funcionário descartável, despersonalizado, diminuído na sua autonomia profissional, um mero "prestador de serviços educativos", muitas vezes, numa lógica vincadamente ocupacional. O desprezo pela nobreza do seu estatuto não vem só dos últimos governos, mas também de uma sociedade que absorveu a narrativa de que "os professores se queixam muito". E por onde têm andado alguns dos sindicatos? Ora, entretidos em negociações inúteis ou engajados em sucessivos teatros de resistência, que nunca produziram verdadeiras conquistas, a confirmar aquele sindicalismo cloroformizado que, como (muito) bem assinalou o saudoso Professor Santana Castilho, tem persistido «na representação do papel de lamuriosas vítimas enganadas e as lutas sindicais têm sido cada vez mais aprisionadas pelos interesses das conjunturas partidárias e cada vez menos centradas na eficácia da defesa dos interesses profissionais dos seus representados. Os sindicatos têm sistematicamente fugido das lutas que provocariam mudanças nas relações de poder. Por acomodação, medo reverencial e iniciativa nula

Professores: da sala de aula para a sala de espera da precariedade

A imagem, com o seu humor descaradamente ácido, capta ainda assim a tragédia da docência em Portugal: o Professor forma a elite profissional do país, mas é remunerado como um estagiário perpétuo, como se tivesse feito um voto de pobreza, aceitando viver com o mínimo necessário, sem acumular bens pessoais, confiando na providência divina e nas comunidades religiosas para assegurar o seu sustento. Se a Educação é a base do progresso das sociedades, cumpre alertar que Portugal constrói o seu futuro sobre areia movediça. É por isso que, quando os jovens não querem ser professores, finge-se surpresa, encenando-se uma preocupação sem verdadeira correspondência com decisões governativas que alterem o estado a que chegámos.